Enunciado melódico(E) — Frase entoacional (PhP)
Um enunciado melódico elementar é constituído por duas células contíguas. A análise de melodias de canções populares mostra que o encadeamento de duas células melódicas cria uma espécie de predicação melódico-harmônica, responsável pelo efeito de sentido de frase musical.
Uma breve digressão é necessária para minimizar a estranheza da expressão “predicação melódico-harmônica”. Em seu sentido mais amplo, a predicação consiste na atribuição de uma dada propriedade a uma entidade. Entidades indeterminadas como, por exemplo, “João”, tornam-se determinadas pela predicação, como em “O João é flamenguista roxo” ou “O João está doente”, por exemplo. Ser flamenguista ou estar doente são determinações de João. A predicação está na base do desenvolvimento discursivo porque é a partir dela que se estabelecem os temas do discurso. Assim, “O João é flamenguista roxo mas nunca foi ao Maracanã” e “O João está doente mas não quer ir ao hospital” são ambos desenvolvimentos discursivos prováveis, uma vez que estabelecem temas (ou seja, o tema do futebol e o tema da saúde, respectivamente). Por outro lado, “O João é flamenguista roxo mas não quer ir ao hospital” não tem o mesmo grau de probabilidade, muito menos “O João está doente mas nunca foi ao Maracanã”, embora sejam ambos possíveis.
Assumimos a hipótese de que existe uma predicação musical e que tal predicação decorre da concatenação entre pelo menos duas células harmônicas, cujos núcleos são preenchidos por funções harmônicas distintas manifestadas por diferentes acordes, daí o termo “predicação melódico-harmônica”. Um único acorde isolado é uma entidade musical tão indeterminada quanto um termo isolado da oração. Assim como este, o acorde é indeterminado no sentido de que diferentes percursos harmônicos podem ser desencadeados a partir dele. Na melodia tonal – que serve de base à canção popular – tais percursos não são estabelecidos pelos acordes em si mesmos (dó maior, sol maior, etc.), mas pelas funções harmônicas a eles associadas (tônica, dominante, etc.). Na medida que tais funções harmônicas encabeçam os núcleos de duas células contíguas, estabelece-se uma predicação musical elementar, ou seja, instaura-se um percurso mínimo, uma direcionalidade no fluxo da melodia.
Na música, assim como na língua, os termos são isolados apenas pela análise. O que existe de fato são cadeias de termos que têm sentido enquanto totalidade. O sentido está na totalidade, não em suas partes. Isso é mais fácil de compreender na linguagem verbal porque as palavras têm um valor referencial que pode ser permutado em função do contexto. O termo “mesa” tem um sentido em “a mesa redonda foi excelente” e outro sentido em “a mesa de madeira está quebrada”. Ou seja, o sentido de “mesa” é relativamente aberto e apenas se concretiza em cada predicação particular. De fato, existem tantos sentidos para “mesa” quantas são suas possibilidades combinatórias.
Pode-se afirmar o mesmo da música em geral e da harmonia em particular: existem tantos acordes de Dó maior, quantas são suas possibilidades combinatórias na cadeia tonal. Por isso, um mesmo acorde tem dois “sentidos” diferentes em (a) e (b), e pode-se dizer, por analogia, que tem-se aqui duas predicações harmônicas distintas:
(a)
Cidade Maravilhosa (André Filho)
#016.01 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP ] [ PhP ] Sílaba ci DA DE ma RA vi LHO SA | | * | * * | | | | * | * * Nota N N N N N N N N Pulso P P P P P P P P Célula C C (DÓMa) (SOLMa)
(b)
Você vai me seguir (Chico Buarque)
#022.01 FrasEnt [ IP] FrasFon [ PhP] [PhP][ PhP] Sílaba vo CE VAI me se GUIR | | * * | | | | * * * Nota N N N N N N Pulso P P P P Célula C C (DÓMa) (FAMa)
Tal relação predicativa entre dois acordes está na base de enunciados musicais elementares, como por exemplo em:
Anunciação (Alceu Valença)
#010.01 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP ] [ PhP][ PhP ][PhP ] Sílaba na BRU ma LE ve DAS paiXÕES que VÊM de DEN tro | | | | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P Cel C C Enunc E
Casinha feliz (Gilberto Gil)
#007.01 FrasEnt [ IP] FrasFon [PhP ][ PhP ][ PhP] Sílaba ON de re SIS teo ser TÃO | | | | | | | Nota N N N N N N N Pulso P P P Cel C C Enunc E
Gabriela (Tom Jobim)
#014.01 FrasEnt [ IP ] FrasFon [PhP ][ PhP ][PhP ][ PhP ] Sílaba TE nho pen SA do MUI to na VI da | | | | * | | | | | * | Nota N N N N N N N N N N Pulso P P P P Cel C C Enunc E
Felicidade (Lupicínio Rodrigues)
#025.01 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP ] [PhP ][ PhP ] Sílaba fe LI ci DA de FOI sem BO ra * | | | | * * | | * * | | | Nota N N N N N N N N N Pulso P P P P P P P Cel C C Enunc E
Gita (Raul Seixas & Paulo Coelho)
#047.03 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP ][ PhP][ PhP ] Sílaba às VE zes vo cê me per GUN ta | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N Pulso P P P Cel C C Enunc E
Travessia (Milton Nascimento & Fernando Brandt)
#057.01 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP ] [PhP][ PhP ] Sílaba quan do VO cê foi em BO ra | | | * * | * * | | | * | Nota N N N N N N N N Pulso P P P Cel C C Enunc E
O núcleo de um enunciado melódico coincide com a célula mais à direita e usualmente é seguido de pausa. Muitas vezes, o núcleo atrai a sílaba mais proeminente de uma frase entoacional. Nesses casos (como nos exemplos acima), o limite do enunciado melódico é determinado pelo alinhamento célula-pulso-nota, o qual por sua vez coincide com a sílaba mais proeminente do verso, pois é simultaneamente o núcleo da palavra prosódica, frase fonológica (PhP) e frase entoacional (IP). Desse modo, o núcleo do enunciado melódico coincide com a coluna mais alta da grade estrutural. Daí a naturalidade com a qual o enunciado melódico se associa à frase entoacional, que por sua vez tende a servir de base para a construção do verso na canção popular.
- A relação enunciado-célula
O enunciado elementar parece ser a unidade superior da hierarquia melódica, ou seja, ele é a mais extensa cadeia de notas passível de análise a partir das suas dependências internas (Hjelmslev,1971:109). Esta é, aliás, uma das diferenças fundamentais entre a melodia da canção popular e as formas musicais da música de concerto, baseadas no desenvolvimento de motivos. Um papel assim proeminente do enunciado elementar talvez se explique pelo fato da canção popular ter sua origem na fala coloquial (Tatit, 2004:153). Versos como “Alguma coisa acontece no meu coração” ou “Quem acha vive se perdendo” são frases verbais, e seria estranho que o cancionista não fosse naturalmente levado a associar tais frases a unidades melódicas correspondentes e coincidentes, dotadas de coesão interna e de um efeito de sentido de totalidade.
Já vimos que o enunciado melódico elementar é constituído por duas células, cada uma das quais encabeçada por uma função harmônica (um acorde), de modo que o fluxo melódico é estabelecido pela direcionalidade criada pela diferença entre estes acordes. Embora o enunciado elementar ocupe um papel de destaque na melodia da canção popular brasileira, por vezes esta se apoia sobre enunciados de três células ou, mais raramente, de uma única célula. Uma tal predominância talvez se deva à simplicidade e à clareza com que o enunciado elementar de duas células estabelece a direcionalidade harmônica que caracteriza o sentido da melodia tonal.
Em canções como Águas de Março, Carinhoso e Bye,bye Brasil, por exemplo, o fio melódico parece estruturar-se sobre segmentos de uma única célula. Veja-se:
Águas de março (Tom Jobim)
#046.49-51 Sílaba é PAU é PE drew FIN do ca min ew RES to do tok ewm POU co so zin ewm CA co de vi dre a vi é o sol é a noi tje a mor tje o la çwew an zol é pe RO ba no cam pwe o NO da ma deir cain GA can DEJ ew ma TI ta pe reir | | | | | | | | Nota N N N N N N N N Pulso P P Célula C Enunc E
Carinhoso (Pixinguinha & João de Barro)
#009.01-02 FrasFon [ PhP] Sílaba Meu co ra ÇÃO Não sei por QUÊ Ba te fe LIZ quan do te VÊ | | | | * * * * * * * * * * * Nota N N N N Pulso P P P P P Célula C Enunc
Bye, bye Brasil (Roberto Menescal & Chico Buarque)
#046.49-51 Sílaba BYE bye bra SIL a UL ti ma FI cha ca IU eu PEN swen vo CÊS naj tianDEI ex PLI ca que TA tu dwo KEJ eu SO an do DEN tro da LEI eu VI um bra SIL na te VE a GO ra já TA tu do BEM | | | | | | | | * * * * Nota N N N N N N N N Pulso P P P P Célula C Enunc E
A ausência de um claro direcionamento harmônico entre dois acordes subsequentes seguido de pausa cria um efeito de sentido de circularidade no desenvolvimento melódico, que parece poder continuar indefinidamente, sem um claro ponto de chegada. A este efeito de circularidade some-se o fato de que o enunciado de uma única célula é por demais breve, associando-se a versos curtos, o que talvez contribua para a pouca frequência com que ocorre na canção popular brasileira.
Considere-se agora o caso de enunciados que parecem construídos com três células. Seriam enunciados “complexos”, ou apenas poderiam ser pensados como mero desenvolvimento de um enunciado elementar? De fato, parece que tais enunciados sempre podem ser analisados como o resultado da degeminação de duas células. Veja-se,por exemplo, a frase inaugural de Sampa.
Sampa (Caetano Veloso)
#044.01 Sílaba AL gu ma COI sa com TE ce no MEU co ra ÇÃO | | | | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P Cel C C C Enunc E
Aqui a frase melódica tem três células e não apenas duas. A questão é saber se as duas primeiras células poderiam constituir um enunciado elementar per se. De fato, este parece ser o caso. Hipoteticamente, a canção poderia ter sido composta, por exemplo, com um enunciado elementar seguido de pausa longa. O que queremos dizer é que tal construção hipotética soa como um enunciado melódico, ou seja, produz tal efeito de sentido. Compare-se por exemplo esta frase artificialmente seccionada com um dos enunciados de Ave Maria.
Sampa (Caetano Veloso)
#044.01a Sílaba AL gu ma COI sa com TE ce | | | | | | | | Nota N N N N N N N N Pulso P P P Cel C C Enunc E
Ave Maria no morro (Herivelto Martins)
#070.19-20 Sílaba E quan do MO rrwiscu RE ce E le vwa DEUS u ma PRE ce | | | | | | | | Nota N N N N N N N N Pulso P P P Cel C C Enunc E
Outra canção de Caetano, O Ciúme, oferece mais uma evidência em favor desta hipótese. O primeiro verso “Dorme o sol à flor do Chico, meio dia” apoia-se numa frase de três células ao passo que o décimo “Sei que o levas todo em ti”, construído sobre o mesmo material, corresponde a um enunciado duas células seguido de pausa. Compare-se:
O ciúme (Caetano Veloso)
#028.01 Sílaba dor meo SOL à flor do CHI co mei o DI a Sílaba sei kjo LE vas to dwen TI * | * | | * * | * | * | | * * | * | * | | * * | Nota N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P Célula C C C Enunc E
O mesmo argumento aplica-se à Marina, canção quase que integralmente baseada na repetição de uma frase de três células.
Marina (Dorival Caymmi)
#049.01;12 Sílaba ma RI na mo RE na Ma RI na vo CÊ se pin TOU eu JÁ des cul PEI mui ta COI sa | | | | | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P Célula C C C Enunc E
Moto contínuo, de Chico Buarque, oferece um exemplo interessante e instrutivo da composição de enunciados. O verso que abre a primeira estrofe (a) contém uma frase melódica de 4 células, ao passo que o verso que fecha a mesma estrofe (b), construído com o mesmo material, contém apenas 2 células, enquadrando-se portanto na definição de enunciado elementar. Mais que isso, a canção é finalizada com um “moto contínuo” de células que se degeminam num espécie de movimento circular, que poderia ser indefinidamente estendido.
Moto contínuo (Chico Buarque)
#055.01 e 04 Síl (a) Um ho mem po dir ao FUN do do fun do do FUN do se for por vo CÊ (b) Bas ta so nharcom vo CÊ | | | | | | | * | | | * | | | * | | | * | | | * * * * * Nota N N N N N N <N N N N N N <N N N N N N <N Pulso P P P P P P P Cel C C C C Enunc E
Extensão do enunciado
A extensão do enunciado melódico depende do tipo de célula que forma sua estrutura básica. Dado que a maioria das melodias é construída com células binárias, ternárias ou quaternárias, cada uma destas com 2, 3 ou 4 pulsos, tem-se um limite das possibilidades combinatórias. Embora a conexão entre o tipo de célula e andamento não seja necessária, melodias de andamento acelerado pedem geralmente uma rápida alternância harmônica, ao passo que melodias lentas tendem a suspender a transição harmônica, sendo favorecidas por células amplas. Compare-se, por exemplo, as melodias de A Galinha e Dois Irmãos. Além disso, a alternância de dois esquemas rítmicos ao longo de uma mesma melodia tem o efeito de sentido de acelerá-la ou desacelerá-la, ainda que mantido o andamento (ver adiante análise de Garota de Ipanema).
A Galinha (Chico Buarque)
#012.01-04 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ Php ][ Php ] Sílaba to do O vo queu CHO co me O co de NO vo to do O vo éa CLA ra éa CA ra do VO vo | | | | | | | Nota N N N N N N N Pulso P P Celula C C Enunc E
Morro Dois Irmãos (Chico Buarque)
#004.01 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP] [ PhP ] Sílaba Dois Ir MÃOS quan do vai AL ta ma dru GA da * | | | * * * * * * * * | | | | | | | | * * * * * * * | * * * * * * * * Nota N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P P P P Célula C C EnuncMel E
Anacruse, corpo e coda
Duas propriedades do enunciado elementar precisam ser agora consideradas, sua estrutura interna e o tipo de pausa que o delimita, quando esta existe. Por razões heurísticas dividiremos o enunciado melódico em três segmentos. Consideraremos como anacruse todo o material melódico que antecede o núcleo da primeira célula, como corpo aquele que se estende entre os núcleos da primeira e da segunda células, e, por fim, como coda o material melódico que se estende para além do núcleo da segunda célula.
Assim, por exemplo, a melodia do primeiro verso de Casinha feliz não possui anacruse ou coda, uma vez que todo o material está compreendido entre os dois núcleos:
Casinha feliz (Gilberto Gil)
#007.01 Sílaba ON de re sis teo ser TÃO | | * | | | * | | Nota N N N N N N N Pulso P P P P Cel C C Enunc E
Já no primeiro enunciado de As Vitrines, há um segmento que antecede o primeiro núcleo, uma anacruse portanto:
As vitrines (Chico Buarque)
#003.01 Sílaba eu te VE jo sa IR por a I | | | | | | | | | * * Nota N N N N N N N N N Pulso P P P Célula C C Enunc E
Por fim, em Amor, I Love You, há um segmento que sucede o núcleo da segunda célula (com a síncope), uma coda portanto:
Amor, I Love You (Marisa Monte)
#021.01 Sílaba DEI xew di ZER que te A mo | | | | * | | | * | * * * * * * Nota N N N N N N #N N Pulso P P P P Célula C C Enunc E
Veremos adiante que esta segmentação pode nos ajudar a compreender certos processos que ocorrem entre dois enunciados subsequentes, como a soldagem e a degeminação. Além da estrutura interna, a ocorrência de pausa delimitando o enunciado constitui fator decisivo na organização de estruturas de ordem superior (estrofe, parte, refrão). Fundamentalmente, os enunciados podem ser delimitados ou não por pausa e, neste caso, eles se apresentam soldados entre si ou degeminados. Há ainda o caso em que a pausa não ocorre no fim do enunciado, mas logo após o núcleo da primeira célula, o que determina um tipo de encadeamento característico e muitíssimo utilizado na canção popular.
Enunciados delimitados por pausa curta
A pausa tem raízes fisiológicas. Seja na linguagem verbal (na fala coloquial ou no verso), seja na música, a pausa é motivada pela necessidade natural que temos de respirar. Daí a tendência da pausa a ocupar o espaço de tempo necessário à respiração, funcionando como elemento rítmico de ordem superior. Na palavra cantada, texto e melodia operam sinergicamente na construção da pausa, e as mais simples melodias populares usualmente associam versos e enunciados melódicos, ambos delimitados por pausas curtas. A Banda #071 e Gita #047 constituem exemplos didáticos:
A Banda (Chico Buarque)
#071.01-04 Sílaba es TA va TO a NA vi * do do MEU a MOR me CHA mou * pra pra VER a BAN da PA ssar * can can TAN do COI sas DJA mor * * | | | | | | | * | Nota N N N N N N <N N Pulso P P P P P Cel C C Enunc E
Gita (Raul Seixas & Paulo Coelho)
#047.03 FrasEnt [ IP ] FrasFon [ PhP ][ PhP][ PhP ] Sílaba às VE zes vo CÊ me per GUN ta | | | | | | | | | * * * Nota N N N N N N N N N Pulso P P P P Cel C C Enunc E
Enunciados delimitados por pausa longa
A pausa pode ser relativamente extensa, a ponto de ter duração similar ou superior ao do próprio enunciado (e do verso) que ela delimita. Esse tipo de pausa é bastante eficaz em canções passionais lentas, e tem implicações sobre a estrutura da estrofe a que pertence. O Ciúme e Construção são exemplos desse tipo de pausa. Nesta última, embora tenhamos uma estrofe de quatro versos, cada qual associada a um enunciado melódico, o arranjo destes não é simétrico.
Construção (Chico Buarque)
#064.01-04 Síl a MOU da que la VEZ co mo se FO ssja ul ti ma (…........................pausa.............................) bei JOU su a mu LHER co mo se FO ssja ul ti ma (…........................pausa.............................) e CA da fi lho SEU co mo se FO ssjo u ni co ja TRA ve ssou a RU a com seu PA sso ti mi do * * * | | | | | | | | | | | | * * | | * Nota N N N N N N N N N N N #N N N Pulso P P P P P Cel C Enunc E
Enunciados não delimitados por pausa
Quando não há pausa delimitando o encadeamento de enunciados, estes podem ser soldados ou degeminados. No primeiro caso tem-se dois enunciados distintos, harmonicamente independentes, unidos por material melódico; no segundo caso, ao contrário, o acorde que fecha o enunciado antecedente é o mesmo que abre o subsequente, de modo que estes acabam por se superpor.
- Enunciados soldados
Vimos que a função demarcatória da pausa tem suas raízes na mecânica respiratória. Portanto, na melodia da palavra cantada (diferentemente da melodia para instrumentos de teclado ou de corda) a pausa constitui elemento essencial. Ocorre que a associação entre enunciado melódico e verso pode resultar num padrão reiterativo rígido na construção da estrofe e do refrão. Daí a introdução um elemento conector entre os enunciados de modo a quebrar a monotonia do padrão repetitivo. O Xote das Meninas ilustra esse tipo de conexão, onde novo material melódico é adicionado de modo a ligar a coda de um enunciado à anacruse do subsequente.
O xote das meninas (Luis Gonzaga & Zé Dantas)
#041.01-04 Sílaba man da ca RU quan do fu lo ra na SE ca é o si NAL kja chu va che ga no ser TÃ o to da me NI na que en jo a da bo NE ke o si nal que o a MOR já che gou no co ra ÇÃO | | | | | | | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P P Cel C C Enunc E
Já em Noite dos Mascarados, os enunciados são soldados entre si de maneira recorrente, determinando um estilo próprio de construção das estrofes.
Noite dos Mascarados (Chico Buarque)
#059.01-05 Sílaba QUEM É VO CÊ a di VI nha se GOS TA DE MIM ho jwsDOIS mas ca RA DOS PRO CU ram os SEUS na mo RA dosPERgunTAN DWA SSIM | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P P P Cel C C Enunc E
Enunciados degeminados
Ocorre degeminação quando a segunda célula do primeiro enunciado e a primeira célula do segundo são preenchidas pela mesma função harmônica, que funciona como um pivô entre as células extremas. Em Retrato em branco e preto, por exemplo, os acordes do primeiro enunciado elementar [JA.co.nhe.cos.pa.ssos.de.ssajs.TRA] são Gm e D/F#, e os acordes do segundo [TRA.da.sei.que.não.vai.dar.em.NA] são D/F# e Fm6.
Retrato em branco e preto (Chico Buarque)
#005.01-04 Sílaba JÁ co NHE ços PA ssos DE ssajsTRA da SEI que NÃO vai DAR em NA etc TRA da SEI que NÃO vai DAR em NA | | | | | | | | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P P P P Cel1 C C Cel2 C C Enunc E¹ E²
Em Caminhemos temos um exemplo interessante desse tipo de encadeamento porque as duas primeiras são seguidas de pausa enquanto as três últimas, de estrutura rítmica similar às primeiras, são degeminadas. O efeito geral é de que estamos diante de novo material melódico, quando, de fato, temos a repetição de uma mesma estrutura frásica elementar apoiada em dois acordes.
Caminhemos (Herivelto Martins)
#065.01-05 Sílaba NÃO eu não PO sso lem BRARque tja MEI MEI NÃO eu pre CI swis que CER que so FRI FRI FA ça de CON ta kiw TEM po pa SSOU SSOU e que TU dwen tre NÓS ter mi NOU NOU e kja VI da não CON ti nu OU | | | | | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P Cel C C Enunc E
Pela mesma razão, não se percebe de imediato que dois dos versos de Romaria, o primeiro pertencente à primeira parte, e o segundo pertencente ao refrão, têm exatamente o mesmo arcabouço estrutural, ou seja, dois enunciados elementares degeminados.
Romaria (Renato Teixeira)
#062.01-02 Sílaba FEI to EU per DI dwin PEN sa MEN to SO brew MEW ca VA LO I lu MI na MI najs CU ri FUN daw TREM da MI nha VI DA | | | | | | | | | | | | | | | * | Nota N N N N N N N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P P P P Célula C C C Enunc E¹ E²
A pausa interna
Um tipo particularmente interessante de degeminação ocorre entre enunciados nos quais a pausa ocorre internamente, não tendo a função demarcatória usual. Este mecanismo é muito eficaz para a criação de canções passionais, uma vez que a pausa pode ser preenchida pelo prolongamento de uma vogal, contribuindo assim para a criação do efeito de sentido da passionalidade. São exemplos, Eu e a brisa, Se eu te pudesse fazer entender, Linda flor e Eu te amo.
Eu e a brisa (Johny Alf)
#066.01-02 Sílaba AH sja ju ven TU de kje sa BRI sa CAN tá fi ca sja QUI co mi go MAIS um | * | * * | | | | | | | | * | Nota N N N N N N N N N N N Pulso P P P P Cel C C Enunc E
Eu preciso aprender a ser só (Marcos Valle)
#067.01-02 Sílaba AH sew te pu DE sse fa ZER en ten DER sem teu a MOR eu não PO sso vi | * * * * | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N Pulso P P P P Cel C C Enunc E
Linda flor (Henrique Vogeler, Luiz Peixoto & Marques Porto)
#068.013-14 Sílaba MAS sje lum di a sou BER que vo cê é quem É | * * * * * * * * | | | | | | Nota N N N N N N N Pulso P P P P Cel C C Enunc E
Eu te amo (Chico Buarque)
#069.01 Sílaba AH se JA per DE mos A no ÇÃO da | * * | | | | | | | | | Nota N N N N N N N N N N Pulso P P P P P P Cel C C Enunc E